quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Resenha do livro História noturna de Carlo Ginzburg

O renomado Historiador italiano Carlo Ginzburg, nasceu na cidade de Turin, Itália, pertencia a uma família de judeus intelectuais, começou seus estudos em Tarem e depois foi para Roma e fez universidade em Pisa, na Escola Normal Superior, foi professor da universidade de Bolonha e da universidade da Califórnia em Los Angeles. Ginzburg é especialista na analise dos processos da inquisição nos séc. XVI e XVII, e muito conhecido do publico brasileiro, principalmente pela obra “o queijo e os vermes”. Apesar de ser um dos pioneiros no estudo de micro história, no livro história noturna o autor não reduz a lente de observação, pelo contrário, Ginzburg amplia e estende o campo de observação, para muito além da Europa, estudando a origem e evolução de vários mitos, até se chegar ao pensamento coletivo comum, de como seria constituindo o Sabá.
Ginzburg, não tem nenhuma confissão religiosa revelada, porém, o seu trabalho da grande importância à religião, devido ao fato do autor ter se especializado em estudar a história das feitiçarias e a importância dos fenômenos religiosos, o que não era algo comum na sua época. O autor trabalhou muito a perseguição imposta à feitiçaria, a escolha de estudar esse tema, se deu pela fascinação que o autor nutriu pelos contos de fada que leu durante a infância, a ligação entre feitiçarias e contos de fadas teve um papel muito decisivo na sua escolha do seu objeto de investigação. História noturna, foi o livro em que o autor trabalhou durante mais tempo, ao todo foram 15 anos de dedicação, com longos intervalos, o próprio autor revela que chegou a pensa que nunca conseguiria terminá-lo, o livro foi lançado em abril de 1989, e aborda o problema do sabá, numa perspectiva ao mesmo tempo histórica e morfológica.
A obra história noturna decifrando o sabá de Carlo Ginzburg, diferente muito de outras obras famosas como o “queijo e os vermes” e “andarilhos do bem”, pois, está obra não se caracteriza como micro história. Pois apesar de manter a temática popular, a obra faz uma longa viagem pelo universo dos mitos em diferentes épocas e lugares geograficamente distantes uns dos outros. A obra também não falar de uma pessoa específica e seu contexto histórico, mais sim das origens antigas por trás da imagem enigmática do sabá. Ginzburg vai relata uma serie de trocas, de contatos e filiações entre diversas culturas, também trabalha na obra a transmissão de estruturas de linguagem pelo inconsciente. Para Ginzburg, os relatos sobre tortura, feitos a respeito do sabá, têm algo comum tanto nas respostas dos interrogatórios, como nas perguntas feitas pelos inquisidores e juízes. Para o autor, tudo isso remete a um longo processo histórico na construção de mitos, que transpõe a barreira do visível e liga pela inconsciente o mundo dos vivos e dos mortos, rompendo a barreira do real e do imaginário.
Ginzburg vai faz um passeio pela Europa, Ásia, África e até mesmo a América, fazendo um paralelo entre os mitos e buscando similaridades e um possível elemento comum, seja estrutural ou literal. Na Grécia, a principal fonte de mitologia universal, Ginzburg se detém um pouco mais em sua obra e encontra estruturas análogas, nas diversas narrativas da mitologia grega. Autores como: Eurípides, Virgílio, Plutarco, Tucídides, Tertuliano, Heródoto, Hesíodo, Homero entre outros. Possuem vários elementos estruturais que se repetem em suas narrativas, como o “pé inchado” de Édipo e o “pé preto” de Melampo, ou mesmo o calcanhar de Aquiles. Para Ginzburg as vulnerabilidades e deficiência física nos protagonistas dos mitos, sejam no calcanhar, ou em uma perna ferida, seja em um simples mortal ou em um deus, como no caso de Hefesto. Repetem-se e refletem formas diferentes com o mesmo traço simbólico, que vai forma um substrato mitológico antigo e inconsciente, que se fará presente na elaboração de estereótipos sobre o sabá e nos tratados demonológicos dos inquisidores, no século XIV e XV. O autor propõe uma interpretação, onde por trás da imagem enigmática do sabá, relacionado a encontros noturnos, onde se pratica orgias, se faz porções mágicas, invoca-se o diabo, entre outras coisas, se revela as expressões de mitos e ritos, advindos de várias origens

Ao apresenta sobre a coxeadura, por exemplo, Ginzburg mostra como o mesmo fenômeno aparece também num rito terena, onde há inúmeros mitos documentados nas Américas, China, na Europa Continental e no Mediterrâneo, todos ligados, numa espécie de conexão transcultural.  O livro está dividido em três partes: Na primeira o autor faz um levantamento histórico, muito minucioso, já na segunda, Ginzburg se utiliza de uma série documental no âmbito geográfico, a última parte do livro o historiador faz um levantamento das estruturas simbólicas, e a sua maior preocupação é descobrir as origens dos elementos, convergidos, que criaram os estereótipos da suposta reunião de bruxas, onde também são analisados os aspectos culturais de diversas civilizações, lugares e épocas distintas.
 Para o autor o mito nos convida a reconhecer a simetria, uma característica dos seres vivos sobre mitos e ritos que se referem à morte, de maneira insistente ao retorno, ou seja, a idéia de voltar à vida. O mito ou rito são transmitidos por meio de mecanismos históricos, as regras formais de sua própria reelaboração, presente na obra o autor faz diversas comparações entre mitos gregos o que neles há em comum com os demais e também outras culturas, onde também são praticados. Para tentar se chegar às origens folclóricas do sabá, Ginzburg estuda de maneira minuciosa a feitiçaria e cultos agrários, como já fazia em suas outras obras. Porém, nesta obra o objeto de pesquisa é expandido para além-fronteiras, não se contentando apenas com o continente europeu, tudo isso, para se chegar às raízes da idéia, de uma sociedade de bruxas e feiticeiros hostis à cristandade. O Autor vai estudar cultos presentes em toda região mediterrânea: nos povos gregos, romanos, celtas, germânicos, além da China pré-histórica, ao Japão e a Lapônia, Ginzburg irá identificar nessas diversas regiões separadas geograficamente, cultos às deusas noturnas, divindades ora feminina, ora masculina, presente em um contexto geográfico-cultural eurasiático.
Por fim, mais não menos importante, é preciso salienta que Ginzburg tece em sua introdução uma crítica, discordando de alguns historiadores como: Trevor-roper e Keitj Thomas; pelo fato dos mesmos, ao tratarem do tema, não colherem material sobre o que pensam as pessoas que acreditam e praticam o sabá, com um apanhado mais próximo à antropologia, estes historiadores foram restritos ao movimento da inquisição e penalidade dos juízes. Ao contrario o objetivo de Ginzburg foi de combinar a forma estrutural e historia do sabá. A leitura dessa obra proporciona ao leitor, mergulhar na mentalidade medieval a respeito do sabá e como a igreja da época, satanizou a cultura dita “paga”. Ginzburg desvendou uma historia “noturna”, que envolve mitos, simbolismo e o medo de uma população, além da coexistência e conflito entre a cultura folclórica medieval e a cultura eclesiástica.

REFERÊNCIAS:

Estudos históricos: Rio de Janeiro, vol. 3. n 6. 1990 pgs 254 – 263.
Historia Noturna decifrando o sabá Tradução Nilson Moulin Louzada2ª edição - 2ª reimpressão - Companhia das Letras






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