Nostra
Aetate
A primeira metade do século XX foi marcada por
vários conflitos que culminaram nas duas guerras mundiais; provocadas, sobretudo,
por um forte nacionalismo, rivalidades, disputas territoriais e econômicas.
Além da constante intolerância religiosa que sempre foi praticada na Europa e
se fortaleceu com o antissemitismo, propagado pelo nazismo na Alemanha. Tudo
isso gerou milhões de mortes em todo o orbe e fez crescer o sentimento de
vingança e xenofobia entre as principais nações envolvidas nos conflitos. A
igreja católica como única instituição presente em quase todos os países
envolvidos nos conflitos. Fez uma espécie de “mea-culpa” e em 25 de dezembro de
1961 o Papa João XXIII por meio da bula papal “humanae salutis”, convoca o concílio vaticano II. É preciso
ressalta que a convocação de um evento dessa magnitude para a igreja católica,
não é algo comum, em média a igreja costuma fazer apenas um concílio por
século, o último concilio havia terminado em 1870, ou seja, é um evento de
caráter extraordinário. Até então, os concílios, em sua maioria, tinham sidos
convocados para estabelecer dogmas de fé. Contudo, o concílio vaticano II não
foi convocado com o intuito de constituir um novo dogma de fé. O objetivo era
pastoral e não doutrinal, a igreja precisava modernizar sua forma de
comunicação com o mundo e rever sua maneira de se relacionar com as outras
religiões.
O concílio foi aberto em 11 de outubro de 1962 e
partia do principio de que a igreja era responsável pelo deposito da sagrada
doutrina cristã e que não poderia em hipótese alguma, se afastar do patrimônio
sagrado da verdade, ou seja, a igreja jamais deveria abandona a doutrina de fé
que fôra construída ao longo dos seus vários séculos de existência. Porém, a
igreja precisava adotar uma forma mais acessível e eficaz de falar com o mundo
moderno, sem perder a sua essência. Após quatro calorosas sessões o concilio
foi finalizado no dia 8 de dezembro de 1965, produzindo 16 importantes documentos,
sendo 4 constituições, 9 decretos e 3 declarações. Desses documentos, dois o “Lumen gentium” e o “Nostra aetate” buscaram tratar da relação que a igreja deveria
designar para com as outras religiões, inclusive as ‘não cristãs’. Apazigua as tensões
e estabelecer uma relação respeitosa e amigável, era o principal objetivo
desses documentos.
A declaração
“Nostra aetate” da qual tratar o
presente texto, reconhecer a religiosidade como algo intrínseco do ser humano e
começa a enxergar as outras tradições religiosas de maneira positiva, admitindo
que possa existir salvação mesmo nas religiões não cristãs. O cristianismo que
por longo tempo sustentou não haver salvação fora da igreja, assume um discurso
mais conciliador e tolerante com relação às diferentes tradições religiosas. A
igreja olhou para dentro de si e procurou em sua essência, a melhor maneira
possível, de estabelecer uma relação cordial com as diferentes tradições
religiosas, sem abrir mão da sua doutrina e verdade de fé. De certa maneira, a
igreja percebeu que a missão nada despretensiosa designada por Cristo, de “ir a
todo o mundo e prega o evangelho a toda criatura”, mostrou-se ser, uma tarefa bastante
árdua e difícil de ser alcançada. Após vários séculos de ação missionária o
cristianismo conseguiu chegar a todos os continentes e em quase todas as
nações. Contudo, converter toda a humanidade ao cristianismo tornou-se algo
utópico e impossível de ser alcançado.
A vitalidade das chamadas religiões mundiais:
hinduísmo, budismo, judaísmo, confucionismo e Islamismo, mostrou a Igreja
católica que mesmo com muito esforço pastoral, a conversão global ao
cristianismo era uma meta muito difícil de ser alcançada. A multiplicidade
religiosa fez a Igreja muda o discurso e aceitar a independência religiosa dos
povos não cristãos. Na declaração “Nostra
aetate” fica bem claro isso, a Igreja procura favorecer a unidade e a
caridade entre os homens, reconhecendo a existência de outros caminhos para se
chegar a Deus. Contudo, deixa claro em seu discurso que a sua estrada é a
melhor pavimentada para se alcançar a Deus, ou seja, a mais completa em
doutrina.
A declaração “Nostra
aetate” vai buscar fomentar por meio da tolerância e do respeito mútuo, a
união e a reciprocidade entre os povos, considerando algo que existe de comum
em cada individuo, o seja, a busca de um mundo melhor, de paz e harmonia. Ao se
referir ao Islamismo a Igreja buscar traços comuns entre as duas doutrinas,
convocando cristãos e mulçumanos a supera o passado conflituoso e a exercitarem
a compreensão mútua para que juntos possam defender e promover a justiça
social. Com relação ao judaísmo documento vai reconhecer sua importância para o
cristianismo e o grande patrimônio espiritual comum entre as duas religiões. Além
disso, a Igreja também vai se posicionar contra o antissemitismo e quaisquer
forma de perseguição contra os judeus, repudiando as manifestações de ódios em
qualquer período que tenham ocorrido. A Igreja ensina que Cristo sofreu
voluntariamente e que sua morte na cruz é um sinal de amor e salvação e não
pode servir de justificativa para propagação do ódio contra os judeus.
Com relação ao hinduísmo e ao budismo a Igreja vai
reconhecer a busca do ser humano pelos mistérios divino. Porém, fica evidente
em suas declarações a dificuldade e o esforço que a Igreja faz, para
compreender essas religiões que não são
monoteístas e que tem doutrinas imensamente diferente do cristianismo. Contudo
a igreja busca olhar para essas religiões com sincero respeito, reconhecendo
que ali também existe o sagrado o verdadeiro o divino e o santo.
Por fim a Igreja deixou claro em suas declarações
que nela se encontra a plenitude dos meios de salvação, isso, porém, não quer
dizer que este seja o único e exclusivo caminho. É possível afirma que existe
uma certa ambiguidade entre e novo discurso da igreja católica na tentativa de
se moderniza, com relação a manutenção da sua doutrina. Contudo, ao chamar para
si a responsabilidade, e condenar veementemente toda e qualquer forma de
discriminação ou violência praticada por motivos de raça, cor ou religião. O
Concílio teve fundamental importância no apaziguamento das tensões, provocadas
principalmente pela visão etnocêntrica de mundo, que a Igreja direta ou
indiretamente ajudou a criar.
Referencias bibliográficas:
DUPUIS, Jacques. O cristianismo e as religiões: do
desencontro ao encontro. São Paulo: Loyola, 2004, pág. 40-69; 88-96.
<https://padrepauloricardo.org/episodios/o-verdadeiro-espirito-do-concilio-vaticano-ii
> Acesso em: 17 de agosto de 2017
http://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-ii_const_19641121_lumen-gentium_po.html
Acesso em: 18 de agosto de 2017
http://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-ii_decl_19651028_nostra-aetate_po.html
Acesso em: 19 de agosto de 2017
https://revistas.pucsp.br/index.php/culturateo/article/viewFile/14956/11152
Acesso em: 20 de Agosto de 2017.