terça-feira, 3 de setembro de 2019


UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
CENTRO DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS
NÚCLEO DE GRADUAÇÃO/LICENCIATURA EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO


Disciplina: NGCR0003 - Teologias das Religiões II 

Claude Geffré nasceu em 23 de janeiro de 1926 na cidade de Niort, oeste da França, apenas oito anos após o fim da primeira guerra, quando a Europa ainda tentava se recuperar. Entrou para “ordem dos pregadores” e em 1948 formou-se na escola de São Tomás de Aquino, em 1965 entra para o “instituto católico de Paris” como professor de teologia fundamental. Nesta época Geffré se encontrava em um contexto pós-segunda guerra mundial e principalmente pós-concílio vaticano II, quando a teologia tradicional passa a ser repensada em duas frentes, a chamada “guinada hermenêutica” e o reconhecimento do pluralismo religioso. Geffré se consolidou em sua vasta carreira como um dos principais teólogos católicos do século XX, sendo uma espécie de mediador entre a fé da igreja com as inúmeras expressões religiosas existentes no mundo contemporâneo.
O autor parte do princípio que o teólogo das religiões não é apenas um mero observador neutro e ao fazer a comparação em teologia das religiões usa a sua própria tradição religiosa como medida, ou seja, como uma espécie de lente cultural que impossibilita a neutralidade. Ainda assim, para Geffré é impossível falar de teologia das religiões sem recorrer ao método comparativo, porém o que o autor apresentar é maneira diferente de usar o método. Primeiramente o seu texto reconhece a originalidade da teologia das religiões e sua tendência de ser o novo horizonte do qual será reinterpretado as verdades fundamentais da fé cristã. Geffré propõe um passo mais além da já conhecida teologia ecumênica, ou mesmo da antiga teologia da salvação dos infiéis. Pois já existe dentro da igreja mesmo antes do concílio vaticano II a discussão sobre a possibilidade de salvação fora do horizonte cristão. A inovação teológica do autor acontece quando afirma que se a igreja já se encontra pronta para reconhecer o juízo positivo em outras religiões, então, por que não afirma que existe um pluralismo de princípio e que este pluralismo, faz parte da vontade misteriosa do próprio Deus.
Segundo o autor foi o ecumenismo começado dentro das religiões cristãs que quebrou a máxima católica de que “fora da igreja não há salvação”. Foi justamente a superação desse absolutismo católico que construiu as bases para desenvolver um ecumenismo inter-religioso e planetário. Geffré reconhece a impossibilidade de se estabelecer uma unidade entre todas as religiões, para o autor o diálogo não significa chegar a uma espécie de “metarreligião” onde todas as diferenças seriam abolidas. Pois, sendo assim haveria uma perda de identidade própria e a especificidade de cada religião ficaria comprometida.
O pioneirismo de Geffré está no fato dele apresentar para teologia das religiões a tarefa de criar um fundamento teológico que possa suscitar na igreja uma atitude nova perante as outras religiões. O mundo contemporâneo não tem mais espaço para um teólogo que se concentrar apenas na defesa dos dogmas é preciso ir mais além da sua própria tradição religiosa. O documento formulado pelo concílio vaticano II a declaração Nostra aetate, aponta essa nova posição da igreja diante das demais religiões mundiais. O Geffré tem um papel importante pós-concílio no sentido apresentar um caminho novo para teologia cristã diante da nova postura da igreja. O autor afirma que estamos vivendo em uma época de tolerância, pluralidade e respeito às opiniões contrárias. Portanto é preciso construir uma fundamentação teológica que comporte a unidade família humana no plano de Deus.
O autor acredita que existe um mistério oculto de Cristo, salvador do mundo, nas diversas tradições religiosas da humanidade, pois é inegável a presença de valores fundamentais para o cristianismo, como a bondade e a caridade nos elementos estruturais das grandes religiões do mundo. Geffré mesmo sendo católico usa o termo “desabsolutizar” o cristianismo como religião histórica, como sendo a melhor forma de compreender as demais religiões. Foge de termos gerais como: exclusivista, inclusivista e pluralista. Pois acredita que esses termos rotulam e enquadra outras verdades religiosas em categorias que fogem do objetivo da teologia das religiões. Para Geffré é preciso exorcizar qualquer “veneno apologético” ao fazer o uso do método comparativo, isso vale tanto hermenêutica dos textos do cristianismo, como para leitura das diversas outras religiões da humanidade.
O norte principal que a teologia da religião deve buscar é o despertar, para construção de uma teologia inter-religiosa, onde cada um se esforça para compreender o outro em sua própria religião, ou seja, em seu próprio horizonte teológico. Por isso o autor afirma categoricamente que o método comparativo não pode comparar doutrinas, instituições ou ritos. Pois estas práticas fazem parte do ser religioso e sua identidade, refere-se, ao que para o outro tem sentido como valor absoluto.
A metodologia comparativa apontada no texto parte do princípio que é preciso reinterpreta o cristianismo tendo em vista a insuperável questão do pluralismo religioso. Para o autor dentro do próprio cristianismo existem mecanismos, ou seja, princípios capazes de ajuda na relativização. Contudo é preciso entender que Geffré não está orientado pela questão da salvação dos homens fora da igreja, o que está se pretendendo é entender o sentido do insuperável pluralismo religioso, qual significado isso representa nos planos de Deus para com a humanidade. Após dois mil anos de evangelização, as religiões continuam existindo com bastante vitalidade, portanto não é possível mais ignorá-las ou rotularas como superstições. É preciso busca entender o significado das religiões em si mesmas, Geffré sugeri que possa haver uma relação autêntica de Deus fora do universo cristão. Então para que exista uma compreensão aprofundada do cristianismo é preciso que haja um diálogo com o outro, reconhecendo assim a existência de um pluralismo de princípio.
Podemos dizer que proposta de Geffré, abri caminho para construção de uma nova identidade cristã, reconhecendo verdades fora do cristianismo e renovando assim a linguagem da fé. Entendo o pluralismo como uma expressão da vontade de Deus, e a diversidade religiosa como melhor forma de expressar sua verdade e seu mistério. Para o autor a verdade não pertence a apenas uma cultura, nem tão pouco várias culturas, mais é o encontro dessa variedade de culturas que pode possibilitar enfim o encontro com a verdade, até então não encontrada em nenhuma delas.






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Referência:
GEFFRÉ, Claude. Crer e interpretar: a virada hermenêutica da teologia. Petrópolis: Vozes, 2004, p. 29-63; 131-154 (Capítulos I e IV).



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